Estudo inédito revela comportamento noturno e ajuda a entender como os répteis reagirão às mudanças climáticas.
Em uma noite quente de primavera na cidade costeira de Townsville, Austrália, dois cientistas navegaram pelo rio Ross em uma canoa, munidos de câmeras e binóculos.
Logo, perceberam algo inusitado: tartarugas-do-rio-Krefft aproveitando a luz da lua, como se estivessem se bronzeando sob o sol.
Eric Nordberg, ecologista da Universidade de New England, na Austrália, e Don McKnight, biólogo da Universidade La Trobe, decidiram investigar esse comportamento nunca antes registrado.
Seis anos depois, a descoberta acidental resultou em um artigo na revista Global Ecology and Conservation, mostrando que tartarugas em todo o mundo exibem esse comportamento e como isso pode ajudar a entender a reação desses répteis ameaçados ao aquecimento global.
Nordberg e McKnight projetaram um estudo global para verificar se as tartarugas de Townsville eram uma anomalia. Apesar das interrupções devido à COVID-19, o estudo foi bem-sucedido: pesquisadores de várias partes do mundo coletaram quase 900.000 fotos de 29 espécies diferentes, representando sete das 11 famílias de tartarugas de água doce. Treze dessas espécies foram flagradas se bronzeando à noite, algumas até mais tempo do que durante o dia.
A pesquisa eliminou fatores como fase lunar, ventos e sanguessugas como causas do comportamento noturno. Além disso, tartarugas foram vistas se bronzeando perto de crocodilos, descartando a hipótese de distanciamento de predadores.
A estudante Rosie Kidman, da Universidade James Cook, decidiu estudar a teoria da termorregulação. Ela capturou 25 tartarugas-do-rio-Krefft e as levou para um ambiente controlado, onde observou como se comportavam com temperaturas diferentes da ideal.
Kidman descobriu que as tartarugas se bronzeavam mais durante o dia e à noite quando a água estava mais quente que o normal, sugerindo que o bronzeamento noturno permite que as tartarugas se refresquem quando a água está quente.
Compreender esse comportamento noturno pode ajudar a prever a resposta das tartarugas ao aquecimento global. Estima-se que as temperaturas globais aumentem cerca de 1,5 graus Celsius até 2030.
A pesquisa de Kidman indica que tartarugas de água doce evitam o calor mais do que se pensava anteriormente, o que pode ser crucial, já que cerca de 60% das espécies de tartarugas e cágados de água doce estão ameaçadas ou extintas, segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza.
A descoberta, segundo McKnight, é um lembrete humilde da importância de continuar estudando até mesmo espécies que acreditamos conhecer bem.